terça-feira, 20 de maio de 2014

As eleições europeias

A respeito dos resultados esperados, segundo opiniões abalizadas e abundantes, parece haver apenas um sólida certeza: a abstenção sairá vencedora, e não apenas em Portugal, sublinhe-se. Na UE, há mesmo a expectativa de uma quebra de participação que conduza a mais de 43% de abstencionistas, até agora o máximo histórico na totalidade dos países que integram a União.
Pessoalmente, lamento a recusa da participação eleitoral. No que respeita a Portugal, onde se espera serem atingidos números acima de 60%, o fenómeno presta-se a justificações, umas eventualmente especulativas, mas outras, a maioria, são consistentes e derivam de condições concretas:

  • ·      Os partidos mais europeístas, PS e PSD, e o flutuante CDS-PP jamais cuidaram de usar uma pedagogia duradoura e eficaz sobre o historial e os objectivos do ‘projecto da EU’, chegando ao ponto da ligeireza e superficialidade na elucidação dos cidadãos e mais lamentavelmente à iniciativa de os afastar de opções de fundo – a deliberação de não referendar o ‘Tratado de Lisboa’ é apenas mero exemplo;
  • ·        Desencadeada a crise, fruto essencialmente de factores externos, a realidade europeia através da política de austeridade da troika (FMI, CE e BCE) representou para centenas de milhares de portugueses - ou mesmo milhões em certos domínios – penosa quebra de rendimentos, o desemprego, a emigração de jovens e outros cidadãos qualificados, o corte de benefícios sociais nas prestações pecuniárias a carenciados, na saúde e no ensino, tudo factores a alimentar sentimentos anti-UE.
  • ·     A campanha eleitoral dos partidos do governo tem-se concentrado na baixa política, com um candidato ‘laranja’ que se repete desmedidamente em acusações e populismos e um parceiro com ar de rufia de frases soltas; ambos sem uma única ideia sobre o projecto europeu que realmente defendem para contrariar o directório da D. Merkel e as divagações do Sr. Draghi e consequentemente do BCE que têm conduzido a uma crise sem fim à vista e, por muito que escondam, não se limita aos outrora ‘PIIGS’ e hoje mais comummente ditos periféricos.
  • ·           O PS, acossado pela índole dos ataques internos às políticas que executou no passado, também não mostra capacidade de ultrapassar as polémicas domésticas e falar com clareza do tipo de projecto europeu por si proposto e que, infelizmente e seja ele qual for, se encontra manchado pelo ‘Tratado Orçamental’ aprovado por Seguro e suas hostes.
  • ·         BE e PCP, feitas as contas, são os mais assertivos nas propostas, mas, é sabido e uma plêiade de comentadores tendenciosos ajudam à exclusão, estão debilitados para obter do eleitorado uma representatividade minimamente significativa.  
De tudo isto, resulta que as eleições europeias não passam de uma espécie de balão de ensaio para as legislativas para o próximo ano, sem nenhum enquadramento estratégico compatível com a necessidade de alterar profundamente a sujeição à Alemanha e seus aliados, os novos sudetas holandeses, finlandeses e austríacos.
Os políticos do famigerado ‘arco do poder’ entrincheiraram-se nos habituais redutos que têm a limitadíssima ambição de aceder ao poder a qualquer preço. Mesmo que, na Europa actual, haja riscos e até certezas de derivas ultranacionalistas, em função dos elevados resultados eleitorais esperados para a Frente Nacional de Marine Le Pen, maioritário com 23% nas sondagens, (França), PVV, 12,3%, (Holanda), UKIP, 34%, (Reino Unido) e até a Alternativa para a Alemanha, 7%, (AfD). Há sondagens que estimam que estes partidos possam obter mais de 150 assentos, num Parlamento Europeu de 751 lugares.
No excelente artigo publicado no Huffington Post, Robert Kunner escrevia:  
Na Europa, os partidos protofascistas são anti-imigrante, anti-Islão, anti-semita e anti-europeu e anti-União Europeia e constituem agora o segundo ou terceiro maior festival num cinto de sociedades anteriormente liberais que se estende desde a Noruega e Finlândia aos Países Baixos e França. Na Hungria, onde o antidemocrático nacionalista partido Fidesz já governa, vence o partido mais extremista Jobbik que está a conseguir ainda maiores ganhos.
Que avaliações fazem os partidos portugueses do ‘arco do poder’ da possibilidade da extrema-direita atingir uma representatividade de peso no PE? Nada dizem e também não sabemos se eles sabem que sabemos que eles muito provavelmente não sabem.

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