Classifico de normal que Cavaco
Silva tenha indigitado Passos Coelho para formar governo. Aguardemos as
consequências: governo de gestão ou a coligação PS+BE+PCP.
Na União Europeia de hoje,
totalmente diferente daquela dos tempos de Jacques Delors. Tornou-se regra renegar
os direitos de soberania de um povo.
Willy Brandt, Olaf Palm, François
Mitterrand, Filipe Gonzalez ou Mário Soares, criadores e fomentadores da Europa
do Estado Social, seriam hoje esquerdistas proscritos.
A actividade política, a ética e a
ideologia de fundo das correntes políticas e dos políticos citados foram
clamorosa e despudoradamente abandonadas pela 3.ª via do trabalhista Tony
Blair, de quem Francisco Assis era um entusiasta seguidor. A continuidade desta
3.ª via foi assegurada por outros social-democratas europeus, destacando-se Gerhard
Schröder que deixou um belo e útil legado anti-social a Angela Merkel.
Os movimentos da 3.ª via nos
trabalhistas ingleses e em partidos europeus da mesma família política constituíram
a resposta aos neoconservadores, encimados por Thatcher (UK) e Reagan (EUA). Imitaram
a diabolização da intervenção do Estado na produção de bens e serviços, eliminando,
sobretudo no Reino Unido, parte de políticas sociais do Estado. Isto,
lembre-se, facilitado pela queda do muro de Berlim e o início do desmoronamento
da URSS de Gorbatchov em 1989.
Cavaco foi um aluno devotado de
Thatcher, Pedro Passos Coelho e Paulo Portas, um dito ‘social-democrata’ e
outro autoproclamado ‘democrata cristão’, formam o trio do neoliberalismo
radical, em sintonia e cega obediência à UE dos tempos modernos.
Cavaco, que desde a nascença tem complexos de presumida superioridade e inteligência falsas, acaba este
segundo mandato desastradamente. Não, em meu entender, porque tenha indigitado
Passos Coelho – esta ‘conta’ ele próprio pagará mais tarde, antes de regressar a
casa.
Sobretudo, foram o tom e as passagens
sensíveis do discurso que, uma vez mais, o distinguem como o ‘ditador de araque’
deste canto sem humano encanto. Ora façamos alguns comentários a algumas dessas
passagens:
- Esta situação é tanto mais singular quanto as orientações políticas e os programas eleitorais desses partidos [PSD; PS e CDS] não se mostram incompatíveis, sendo, pelo contrário, praticamente convergentes quanto aos objectivos estratégicos de Portugal.
Comentário: é curioso que tenha esquecido
essa situação singular, ao tempo do governo do PS de Sócrates e tenha feito um
discurso mais do que sórdido na AR anti PS.
- Assim ocorreu em todos os actos eleitorais em que a força política vencedora não obteve a maioria dos deputados à Assembleia da República, como aconteceu nas eleições legislativas de 2009, em que o Partido Socialista foi o partido mais votado, elegendo apenas 97 deputados, não tendo as demais forças políticas inviabilizado a sua entrada em funções.
Comentário: não viabilizaram a sua entrada em
funções, mas inviabilizaram a continuação em funções a meio da legislatura;
nessa altura, Cavaco até ficou grato à votação conjunta do PSD, CDS, PCP e BE
para derrubar Sócrates.
- …é meu dever, no âmbito das minhas competências constitucionais, tudo fazer para impedir que sejam transmitidos sinais errados às instituições financeiras, aos investidores e aos mercados…
Comentário: os sinais errados às instituições
financeiras, aos investidores e aos mercados ficaram acesos e bem vivos desde
já por Cavaco – caso a coligação PàF venha a ser afastada do poder por votação
de moção de rejeição na AR, a coligação à esquerda que eventualmente lhe
sucederá já tem a indelével marca negativa que Cavaco lhe plasmou.
- É aos Deputados que compete decidir, em consciência e tendo em conta os superiores interesses de Portugal, se o Governo deve ou não assumir em plenitude as funções que lhe cabem.
- Como Presidente da República assumo as minhas responsabilidades constitucionais.
- Compete agora aos Deputados assumir as suas.
Comentário: o trecho mais reles da
comunicação cavaquista está compreendido nestes três pontos com que Cavaco
finalizou o faccioso, sórdido e desconexo discurso – um PR a tentar incrustar o
divisionismo na bancada parlamentar socialista classifica Cavaco como um homem
de carácter rasteiro.
Que Cavaco Silva regresse quanto antes à Travessa do Possolo e se
entretenha a falar com o senhor da mercearia da esquina. Que haja festança
depois da saída de Belém nas marquises do País, porque os muitos cidadãos anti Cavaco
também precisam de comemorar o alívio da partida com regozijo.
(Nota: reafirmo a minha não
militância partidária e os meus ideais de esquerda).
Sem comentários:
Enviar um comentário