Há década e meia, ou mais, que retenho na memória uma entrevista de Maló, guarda-redes da Académica dos anos 60, depois Professor Catedrático da Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra. Dizia ele, então:
“Faço parte dos 800.000 portugueses que deixaram de ir ao futebol”.
Na altura por iniciativa da FPF, da Liga de Futebol, ou duma dessas coisas, havia sido publicado um estudo a evidenciar a queda do número de espectadores de futebol; grupo em que eu e pelos vistos Maló nos integrávamos.
A despeito de minorias de dirigentes poucos escrupulosos, e árbitros transgressores de regras da ética e da honestidade, o passado, nos anos 60, assentava, sobretudo, em paixões e dedicações clubistas. O paradigma do tempo ficou registado na história. Chamem-lhe ‘período romântico’ ou usem outra classificação pejorativa; todavia, nunca conseguirão negar a pureza, de então, face aos dislates e assalto de abutres que, posteriormente, se projectaram na vida à custa do ‘pontapé no esférico’ – sem vestir camisolas, nem calções ou calçarem chuteiras.
Concentrando-me, de facto, no futebol português, o ambiente foi infectado e a contaminação é vasta; nomeadamente, através de dirigentes de clubes pagos com centenas de milhares ou mesmo mais de um milhão de euros anuais (ver contas das SAD’s do F.C.Porto e Benfica, por exemplo). A estes, há a acrescentar esse outro bando de aves de rapina, os empresários.
Com estes privilegiados, e os respectivos batalhões de jovens alucinados, com ou sem álcool ou drogas, em jogos, em assembleias-gerais; ou ainda por influência de declarações inflamadas dos cabotinos que, à 2.ª feira, polvilham as estações televisivas, à roda do futebol passou a respirar-se o fedorento ar de matéria orgânica em decomposição acelerada, temperada de promiscuidades em que os políticos são coniventes.
Costumo dizer que, actualmente, o futebol português tem dois “grandes” (Porto e Benfica) e meio (Sporting), a que se seguem uma longa fila de palhaços ‘faz-tudo’ que, neste circo, vai entretendo a malta, nos interlúdios da vida dura. De volta e meia, lá vem um ‘faz-tudo’ que sai da casca – nos últimos anos tem sido o Braga, mas, como o Boavista de há anos, são figuras pré-destinadas a assomos de rápida erosão.
O futebol português transformou-se, pois, neste acervo de ordinária sucata. A agressão ao Dr. Daniel Sampaio não é problema exclusivo do Sporting; como, há anos, a moeda atirada a Torres Couto à entrada ou saída de assembleia do Benfica não o foi em relação ao clube da Luz.
O processo degenerativo e de decadência atinge a organização do futebol como um todo. Há muito. Excede o âmbito do Sporting ou de qualquer outro clube, refugiando-se em coito em que energúmenos fecundam e se reproduzem.
(Obs.: não sou simpatizante, adepto entusiasta ou associado de qualquer dos “dois grandes e meio”)
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