quarta-feira, 5 de março de 2014

O “descaraBento”!

A vida recomenda-nos reforçada prudência em relação a quem, na monotonia no discurso, se revela sempre circunspecto, artificialmente racional e, sobretudo, resistente a reacções emotivas; isto, por muito polémico que seja o tema em debate. Este é caso do calvíssimo Vítor Bento, um independente próximo do PSD, maçónico e "Conselheiro de Estado", seleccionado por Cavaco Silva para substituir o arguido do caso BPN, Dias Loureiro.
Vítor Bento, presidente da SIBS, com argumentos próprios de quem, sem cuidar de respeitar o racional, na AR, no estilo monocórdico que lhe é peculiar, defendeu a penalização dos utilizadores das caixas multibancos (ATM), nos seguintes termos:
Sugeriu inclusivamente a aplicação do Imposto de Selo a essas operações, tendo, a seu lado, o coro dos representantes da Unicre e da Mastercard, também presentes na sessão. Em uníssono, rebelaram-se contra o projecto do PS de fazer baixar as comissões cobradas aos comerciantes, nos pagamentos pelo MB. Claro que o “descaraBento” – contracção das palavras descaramento e Bento – teve imediata e forte oposição da Confederação do Comércio e Serviços de Portugal e da Confederação das Pequenas e Médias Empresas.

Todavia, na arguição, Bento ainda foi mais ousado:
“A Banca não é um sector lucrativo”
O topete serve-se de uma enorme falsidade. Os 7.000 M euros de prejuízos da banca devem-se a tudo, menos ao uso das ATM. Estas máquinas, como afirmei há dias noutro texto, representaram para os bancos consideráveis economias em custos com pessoal.
Nos últimos 10 anos, a redução de trabalhadores bancários atingiu vários milhares – as operações de levantamentos, pagamentos de serviços e ao Estado, recarregamento de telemóveis, consulta de saldos e outras, feitas pelos clientes, dispensaram a intervenção de pessoal dos balcões. Todavia, a decapitação de postos de trabalho na banca não ficará por aqui, uma vez que CGD, BPI e BCP, e necessariamente outros como o BES, continuam a reduzir balcões e trabalhadores, a despeito da recapitalização feita à custa dos contribuintes.
O BCP, se já não o fez, prepara-se para um corte de salários de 10%. E se houve sector mais favorecido pelas novas tecnologias – o ‘homebanking’ também conta para as economias de custos e tempos de trabalho – foi justamente a banca portuguesa que, por sistemas informáticos sofisticados, realiza diariamente milhares ou mesmo milhões de operações, muitas das quais a nível internacional, com escassa intervenção humana.
A banca se, no presente, não constitui um sector lucrativo, deve-se essencialmente a imparidades de crédito concedido sem critérios prudenciais: os baixíssimos ‘spreads’ no crédito para casa própria, as operações de concessão de financiamento a ‘Berardos’ e muitos mais sob garantias de valor volátil, a aquisição de dívidas soberanas como a da Grécia e até de dívida portuguesa, de que a ‘troika’ mandou cobrir parte com imparidades.
A tese de Vítor Bento não é apenas intelectualmente desonesta, como injusta para os portugueses de contas certas, que são muitos, e mais uma vez vão ser chamados a compensar os desmandos da gestão de banqueiros, onde se incluem, por exemplo, as exageradíssimas reformas pagas a Jardim Gonçalves, Paulo Teixeira Pinto e outros que tais – sei que são muitos, para além das altíssimas remunerações e prémios pagos a administradores e quadros superiores no activo.
O que Vítor Bento defende é, de facto, um inaudito “descaraBento” – só lembraria a calvos, por fora e por dentro, do tipo dele e certamente do Camilo Lourenço.
(Adenda: a calvície de Vítor Bento, felizmente, não se deve a doença grave, mas a uma patologia de queda intensa de cabelo conhecida por alopecia; por isso, a citei).  

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